Por que sacerdotes de religiões afro criticam tanto a Magia do Caos?


Vivemos em uma era em que o acesso ao conhecimento espiritual deixou de ser monopólio de castas, ordens ou terreiros. A internet, os livros e as experiências pessoais abriram brechas no que antes era uma muralha dogmática — e nesse cenário, a Magia do Caos floresce como um dos caminhos mais subversivos e libertadores.

Natural, então, que ela seja atacada por aqueles que se beneficiam da manutenção dessas muralhas.

Nos últimos anos, tornou-se comum ver pais de santo, tatas de Quimbanda e sacerdotes de diversas religiões de matriz africana zombando, debochando e até tentando ridicularizar a Magia do Caos nas redes sociais. Mas a pergunta que precisa ser feita é: o que, de fato, está por trás desse incômodo?


1. A quebra da hierarquia como ameaça

As religiões tradicionais afro-brasileiras operam dentro de estruturas verticais. Tempo de casa, iniciações, obrigações e a posição hierárquica do sacerdote são elementos centrais para o funcionamento dessas espiritualidades. A autoridade é acumulada com o tempo — e questionar isso é quase uma blasfêmia.

A Magia do Caos, por sua vez, parte do princípio de que o poder é pessoal, interno e acionável agora. Não exige anos de feitura, nem submissão a um dirigente. A ideia de que um magista possa acessar forças espirituais e ter resultados sem passar pelo crivo do terreiro é, para muitos, intolerável.

Esse desconforto não tem a ver com "segurança espiritual", mas com perda de controle. Porque se alguém pode alcançar resultados mágicos sem precisar ser "filho" de ninguém, o trono do pai de santo torna-se simbólico. E tronos simbólicos ruem com mais facilidade.


2. Deboche como máscara do medo

As provocações públicas, os emojis de riso e as ironias baratas escondem algo mais profundo: insegurança disfarçada de superioridade.

Muitos desses sacerdotes não zombam porque são fortes — zombam porque estão ameaçados. A expansão da Magia do Caos revela que é possível fazer magia eficaz, coerente e transformadora sem o teatro dos paramentos, das obrigações e do segredo artificial.

O riso, nesse caso, é o último suspiro da autoridade que percebe que perdeu o monopólio do sagrado.


3. O falso sincretismo como cárcere disfarçado

Dentro dos cultos afro-brasileiros, há uma obsessão por protocolos. A forma correta de chamar Exu, o ponto riscado adequado, o assentamento apropriado. Tudo tem uma forma — e desviar dessa forma é considerado um "desrespeito".

Mas o que é mesmo desrespeito? Chamar uma entidade por uma via diferente? Ou repetir sem reflexão as fórmulas herdadas de um sistema religioso construído sob colonização, medo e sobrevivência?

A Magia do Caos não "desrespeita" Exu. Ela apenas o trata como uma força livre, simbólica, dinâmica — e não como propriedade exclusiva de uma liturgia enrijecida. Isso é visto como afronta, quando na verdade é libertação.


4. O problema da autonomia espiritual

Um sacerdote que oferece jogo, ritual, ebó, despacho, firmeza, iniciação e proteção — muitas vezes em um ciclo sem fim — depende da dependência alheia. A espiritualidade se torna um serviço recorrente.

Agora imagine o caos (literal e simbólico) quando o cliente percebe que pode operar por si só. Que pode acessar os arquétipos, manipular símbolos, criar pactos e alterar sua realidade com base na própria vontade.

Isso é inadmissível para quem depende do outro estar de joelhos.


5. O poder de incomodar está nos resultados

Nenhum sistema tradicional se move para atacar algo irrelevante. O ataque é sempre sinal de ameaça.

Se a Magia do Caos fosse inofensiva, seria ignorada. Mas como ela funciona, como ela transforma, como ela liberta, torna-se perigosa. E tudo que liberta é perigoso para quem lucra com a prisão.


Conclusão: a liberdade sempre assusta quem vive da obediência

A magia do caos não é uma afronta à espiritualidade. É uma afronta à autoridade forjada no medo. Ela não nega os orixás, os exus, os encantados. Apenas recusa as correntes que colocaram sobre eles.

Ela ensina que o magista é o ponto central da operação. Que não há necessidade de intermediação se a conexão for verdadeira. Que tudo pode ser adaptado, ressignificado, reinventado. E é justamente isso que mais incomoda: a liberdade do outro confronta a prisão que se tornou confortável.


Agora...

Se a Magia do Caos é tão fraca, irrelevante ou errada...
Por que será que tantos pais de santo são meus alunos silenciosos?



Comentários